A Convenção relativa à Transferência de Pessoas Condenadas, do Conselho da Europa (COE) entrou em vigor internacional para o Brasil em 1º de outubro de 2023.
Conhecido como Convenção 112, esse tratado foi adotado em Estrasburgo em 1983 e passou a valer na Europa em 1º de julho de 1985. Até nosso ingresso, obrigava 45 Estados membros do COE e 23 Estados terceiros. O Brasil se tornou o 69º Estado Parte. A Convenção 112 é um tratado regional de tipo aberto, o que permite a adesão de países que não integram o Conselho da Europa. O Brasil foi convidado a aderir ao texto em 2019.
O projeto de decreto legislativo (PDL) 768/2019, que confirmou o ingresso do Brasil no tratado multilateral europeu, foi convertido no Decreto Legislativo 134/2022. Isso permitiu que o Itamaraty depositasse o instrumento de adesão junto ao Conselho da Europa, o que ocorreu em 26 de junho de 2023. Pela regra de vigência para novos Estados Partes, a Convenção 112 passou a valer internacionalmente para o Brasil em 1º de outubro de 2023, que corresponde ao primeiro dia do mês seguinte ao esgotamento de um prazo de três meses, contados a partir do depósito do instrumento de adesão.
A vigência interna da Convenção no Brasil ainda depende da publicação do decreto presidencial. Sim, é estranho, mas o duplo prazo de vigência é o que normalmente ocorre. Contudo, como este é um tratado de direitos humanos, cuja finalidade é facilitar a reintregração social de pessoas presas em países que não são os seus, sustento que a Convenção 112 deve ter efeito imediato a partir da vigência internacional, nos termos do art. 5º, §1º, da Constituição de 1988.
§ 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
A Convenção 112, cujo texto em português pode ser lido abaixo, torna-se o segundo tratado do COE ao qual o Brasil adere. O primeiro foi a Convenção sobre Cibercrime, concluída em Budapeste em 2001 (ETS 185), promulgada pelo Decreto 11.491/2023.
Com a entrada na ETS 112, amplia-se significativamente o conjunto convencional nacional para medidas de traslado internacional de presos, que se aplica quando já iniciada a execução penal no Estado da condenação. Até agora o Brasil tinha vínculos bilaterais neste tema com apenas 17 países. O preso será então transferido voluntariamente ao país do qual é nacional. Este instituto difere da extradição, que tem pressupostos e propósitos distintos, já que ocorrerá quando o réu ou sentenciado estiver foragido, com a finalidade de submetê-lo a julgamento ou dar-se início ao cumprimento da pena. Se vier a ser preso no exterior, será transferido compulsoriamente ao pais no qual foi ou será julgado.
Brasileiros que cumpram penas nos outros 68 países que integram esse regime jurídico poderão ser mais facilmente removidos para o Brasil para continuar aqui a execução penal. Na via inversa, estrangeiros que aqui sejam detentos poderão prosseguir no cumprimento da pena em seus países de nacionalidade, se preenchidos todos os requisitos convencionais. As nações não-COE que integram o tratado 112 são: Austrália, Bahamas, Bolívia, Canadá, Chile, Coréia do Sul, Costa Rica, Equador, Estados Unidos, Gana, Honduras, Índia, Israel, Japão, Maurício, México, Mongólia, Panamá, Rússia, Tonga, Trinidad e Tobago e Venezuela, além da Santa Sé. Confira a lista completa dos Estados Partes aqui.
No direito brasileiro, a transferência de pessoas condenadas é regulada pelos artigos 103 a 105 da Lei 13.445/2017 – Lei de Migração. Tratei do tema em um capitulo deste livro. O Brasil coopera para o traslado de detentos para cumprimento de pena, mediante reciprocidade ou com bases em acordos internacionais, bilaterais ou multilaterais, sendo quatro firmados no âmbito da OEA, da CPLP e do Mercosul.
A Convenção 112 do COE foi complementada por dois Protocolos:
⁃ Protocolo Adicional à Convenção (ETS 167); e o
⁃ Protocolo de emenda ao Protocolo Adicional à Convenção (CETS 222).
Sobre o tema, sugiro o livro da juíza federal Debora Valle de Brito, que acaba de ser lançado pela RT:
Defensores públicos ou advogados criminalistas brasileiros que tenham como assistido ou cliente um preso estrangeiro no Brasil podem pensar em usar esses tratados para que o condenado cumpra sua pena mais perto da família, facilitando o apoio durante a execução penal e a reinserção social.
FONTE: ACORDA CIDADE / Vladimir Aras
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